Religioso é acusado de participar de trama para impedir posse de Lula; investigado nega envolvimento e alega apoio espiritual a Bolsonaro
Caso de Política | Luís Carlos Nunes – O padre José Eduardo de Oliveira e Silva, da Diocese de Osasco (SP), figura entre os 37 indiciados pela Polícia Federal (PF) sob a suspeita de integrar uma conspiração para um golpe de Estado. A investigação aponta que o religioso participou de reuniões com o ex-presidente Jair Bolsonaro, considerado o principal articulador da trama. Entre as propostas debatidas, estariam a decretação de estado de sítio e a prisão de autoridades.
As suspeitas contra o padre ganharam força após o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator premiado, relatar a presença de José Eduardo em encontros relacionados ao suposto plano golpista. Uma das reuniões teria ocorrido em 19 de novembro de 2022, com a participação do ex-assessor Filipe Martins e do advogado Amauri Feres Saad, ambos também indiciados nesta quinta-feira (21).
Apesar das acusações, o padre nega envolvimento direto e afirma que sua relação com Bolsonaro é exclusivamente de apoio espiritual, desde que o político sofreu um atentado em 2018.
Cursos espirituais e presença online
Conhecido por sua influência no meio católico e nas redes sociais, o padre José Eduardo utiliza seu site e perfis no Instagram, que somam 440 mil seguidores, para divulgar e vender cursos espirituais. Com valores entre R$ 379 e R$ 897, os cursos incluem títulos como “Aprenda a combater o mal” e “Aprenda a combater os demônios”. As aulas prometem ensinar formas de enfrentamento espiritual, sob a perspectiva da “batalha contra forças demoníacas”.
No site, uma das mensagens promocionais do curso diz:
“Nesse curso você aprenderá a se blindar das forças demoníacas e se preparar para a batalha espiritual”.
O padre também enfatiza a urgência de se posicionar espiritualmente em um mundo que, segundo ele, vive um agravamento do “combate diário contra o inimigo”.
Investigação e críticas à PF
Em fevereiro de 2024, o pároco foi alvo de busca e apreensão pela PF, suspeito de integrar um “núcleo jurídico” que apoiaria os movimentos para impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Durante a operação, o celular do padre foi confiscado, o que gerou protestos de sua defesa, que acusou os investigadores de violação ao sigilo sacerdotal.
Após o indiciamento, a defesa do religioso classificou a divulgação dos nomes pela PF como “abuso”. O advogado Miguel Vidigal afirmou que a nota oficial do órgão comprometeu a investigação e desrespeitou o sigilo imposto pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
Trama golpista e possíveis punições
O indiciamento de Bolsonaro e outras figuras públicas, como os ex-ministros militares Braga Netto e Augusto Heleno, está inserido em uma investigação de 800 páginas que será enviada ao STF. Se os indiciados forem denunciados e a Corte aceitar a denúncia, poderão responder por crimes como golpe de Estado (pena de 4 a 12 anos de prisão), abolição violenta do Estado Democrático de Direito (4 a 8 anos) e organização criminosa (3 a 4 anos).
A Procuradoria-Geral da República (PGR) avaliará os indiciamentos e decidirá os próximos passos. O padre José Eduardo, por sua vez, mantém a defesa de sua atuação, agora sob os olhares atentos da Justiça e da sociedade.
Veja a lista completa dos indiciados, por ordem alfabética:
- Ailton Gonçalves Moraes Barros: Ex-major do Exército e advogado. Foi um dos investigados no episódio da inserção de informações fraudulentas no cartão de vacinação do ex-presidente Jair Bolsonaro.
- Alexandre Castilho Bitencourt da Silva: Coronel do Exército, também foi alvo da investigação do Ministério Público Militar acerca da elaboração de uma carta que, no fim de 2022, pressionava a cúpula das Forças Armadas a agir de forma impedir a posse de Lula.
- Alexandre Ramagem: Ex-diretor da Agência Brasileira de Informações (Abin) no governo Bolsonaro. Atualmente, o delegado federal é deputado federal (PL-RJ).
- Almir Garnier Santos: Ex-comandante da Marinha de abril de 2021 a dezembro de 2022.
- Amauri Feres Saad: Advogado e foi apontado pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro como coautor da minuta golpista.
- Anderson Lima de Moura: Coronel do Exército também foi investigado pelo Ministério Público Militar, apontado como um dos autores da carta que pressionava a cúpula das Forças Armadas a aderirem a um golpe de Estado.
- Anderson Torres: Delegado da Polícia Federale ex-ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro,chefiava a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal quando golpistas atacaram os Três Poderes em 8 de janeiro de 2023.
- Angelo Martins Denicoli: Major da reserva do Exército, foi nomeado diretor de Monitoramento e Avaliação do Sistema Único de Saúde, durante a gestão do general Eduardo Pazuello à frente do Ministério da Saúde.
- Augusto Heleno: General da reserva do Exército, foi ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do governo Bolsonaro.
- Bernardo Romão Correa Netto: Coronel do Exército, chegou a ser detido em fevereiro deste ano, no âmbito da Operação Tempus Veritatis, da Polícia Federal. Segundo essas investigações, ele atuou na preparação da reunião de militares de tropas especiais (os chamados kids pretos) selecionados para participar da tentativa de golpe de Estado. É considerado, segundo a PF, homem de confiança do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid.
- Carlos Cesar Moretzsohn Rocha: Engenheiro especialista em segurança da informação, é o fundador do instituto contratado pelo PL para apontar supostas falhas das urnas eleitorais eletrônicas. O parecer do instituto serviria de base para o partido questionar a legitimidade da eleição de Lula.
- Carlos Giovani Delevati Pasini: Coronel da reserva do Exército, também foi investigado no Inquérito Policial Militar (IPM) sobre a participação de militares na elaboração da carta que pressionava a cúpula das Forças Armadas.
- 13. Cleverson Ney Magalhães: Coronel do Exército e ex-oficial do Comando de Operações Terrestres. Investigações anteriores apontam que ele faria parte do núcleo operacional de apoio às ações golpistas e atuado na manutenção de manifestações em frente aos quartéis.
- Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira: General de Brigada do Exército. Ex-comandante militar da Amazônia e ex-chefe do Comandante de Operações Terrestres do Exército. Investigado pela PF na Operação Tempus Veritatis, deflagrada em fevereiro.
- Fabrício Moreira de Bastos: Foi comandante do 52º Batalhão de Infantaria de Selva em Marabá (PA). É atualmente adido militar em Israel. Supostamente, participou da elaboração da carta escrita para forçar a adesão à tentativa de golpe de Estado.
- 16. Fernando Cerimedo: Consultor de marketing político, investigações apontavam que teria atuado na elaboração de estratégias para atacar o sistema eleitoral brasileiro e fazer falsas denúncias de fraude. Ele é argentino e trabalhou na campanha eleitoral de Javier Milei, atual presidente da Argentina, extremista de direita.
- Filipe Garcia Martins: Discípulo do escritor Olavo de Carvalho, foi assessor especial para assuntos internacionais da Presidência da República do governo de Jair Bolsonaro. Ele teria integrado o núcleo de juristas que formulou textos que serviriam como decretos após o golpe de Estado. A PF já havia apontado que ele teria entregue ao ex-presidente a minuta do golpe.
- Giancarlo Gomes Rodrigues: Subtenente do Exército, cedido à Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Foi preso em julho durante a Operação Última Milha, da PF, sob acusação de compartilhar publicações em redes sociais que propagavam informações obtidas de forma ilegal. Foi solto em agosto.
- Guilherme Marques de Almeida: Tenente-coronel de Infantaria. Foi comandante do 1º Batalhão de Operações Psicológicas do Exército, com sede em Goiânia. Foi exonerado após o ministro Alexandre de Moraes (STF) determinar o afastamento de militares investigados por envolvimento na tentativa de golpe. Ficou conhecido em fevereiro ao saber que era alvo de investigação da PF, pois teria atuado na criação e distribuição de notícias falsas sobre as eleições presidenciais.
- Hélio Ferreira Lima: Tenente-coronel foi um dos presos na última terça-feira (19) por suposto envolvimento na elaboração de plano de assassinato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes. O militar comandou até fevereiro a 3ª Companhia de Forças Especiais de Manaus (Comando Militar da Amazônia).
- Jair Bolsonaro: Ex-presidente da República (2019-2022). Por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), está inelegível até 2030 por fazer denúncias sem provas contra as urnas eletrônicas durante reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada em agosto de 2022.
- José Eduardo de Oliveira e Silva:Pároco da Diocese de Osasco (SP), já havia sido investigado por envolvimento na elaboração de minutas de decretos com criação jurídica para fundamentar um golpe de Estado. Em fevereiro, foi alvo da Operação Tempus Veritais.
- 23. Laércio Vergilio: general da reserva do Exército, é investigado pela Polícia Federal por suposta participação em plano para prender o ministro Alexandre de Moraes. Em áudios captados com autorização judicial, foi flagrado em contato com Ailton Gonçalves Moraes Barros, ex-major do Exército investigado pela inserção de informações fraudulentas no cartão de vacinação de Jair Bolsonaro.
- Marcelo Bormevet: Agente da Polícia Federal cedido à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo Bolsonaro. Teria dado ordens a Giancarlo Gomes Rodrigues para publicar em redes sociais informações ilegais.
- Marcelo Costa Câmara: Coronel do Exército. Foi assessor especial da Presidência da República, no gabinete pessoal de Jair Bolsonaro. Esteve preso entre fevereiro e maio deste ano, após investigações apontarem que atuava no núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral.
- 26. Mario Fernandes: General da reserva, secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência durante o governo Bolsonaro, teria liderado a elaboração do suposto plano Punhal Verde e Amarelo para assassinar Lula, Alckmin e Moraes.
- Mauro Cid: Tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, é considerado um dos homens mais próximos do ex-presidente. Investigado em mais de um inquérito, ficou preso preventivamente entre maio e setembro do ano passado por falsificar dados no cartão de vacinação. Neste ano, ficou preso entre março e maio após a circulação de áudios nos quais reclamava do tratamento do ministro Alexandre de Moraes (STF) e dos investigadores da PF. Depoimento do tenente-coronel nesta quinta-feira (21) complementará informações do atual inquérito.
- Nilton Diniz Rodrigues: General do Exército, foi comandante da 2ª Brigada de Infantaria de Selva, em São Gabriel da Cachoeira. Foi assistente do general Freire Gomes, ex-comandante do Exército entre março e dezembro de 2022.
- Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho: Neto de João Figueiredo, o último general presidente na ditadura militar, foi indiciado anteriormente por suposta propagação de desinformação golpista e antidemocrática.
- Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira: General do Exército, foi ministro da Defesa entre 1º de abril de 2022 e 31 de dezembro de 2022, e foi comandante do Exército entre 20 de abril de 2021 e 31 de março de 2022. Ele teria participado do grupo que pretendia apontar supostas fragilidades nas urnas eletrônicas, que não foram provadas.
- Rafael Martins de Oliveira: Tenente-coronel do Exército, foi preso preventivamente na última quinta-feira (13) em investigação sobre suposto plano de assassinar Lula. Conhecido como um “kid preto”, grupo de elite da Força Armada, teria fornecido orientações para a execução do crime.
- Ronald Ferreira de Araujo Júnior: Tenente-coronel do Exército, tem experiência na área de defesa, com ênfase em comunicações e guerra eletrônica. Investigações anteriores apontaram participação do militar na elaboração da minuta golpista.
- Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros: Tenente-coronel do Exército, o militar teria atuado no núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral.
- Tércio Arnaud Tomaz: Foi assessor especial da Presidência da República durante o governo de Jair Bolsonaro, de quem anteriormente foi secretário parlamentar. Era apontado, pela PF, como o líder do chamado “gabinete do ódio” responsável por publicações falsas em redes sociais que supostamente favoreciam o governo e atacavam adversários.
- Valdemar Costa Neto: Presidente nacional do Partido Liberal, legenda de Jair Bolsonaro. Durante seis mandatos, Valdemar foi deputado federal por São Paulo. Renunciou o mandato e foi um dos condenados no esquema do mensalão.
- Walter Souza Braga Netto: General da reserva, foi candidato à vice-presidente em 2022 na chapa com Jair Bolsonaro. Braga Netto foi ministro-chefe da Casa Civil, de 2020 a 2021, e ministro da Defesa, de 2021 a 2022. A Policia Federal apurou que uma das reuniões realizadas para tratar de suposto plano golpista para impedir a posse e matar o presidente Lula teria sido realizada na casa do militarem novembro de 2022.
- Wladimir Matos Soares:Policial federal. Foi preso na última terça-feira (19) por suposta participação no plano para assassinar o presidente Lula.
As investigações apontaram que os envolvidos se estruturaram por meio de divisão de tarefas, o que permitiu a individualização das condutas e a constatação da existência de ao menos seis núcleos: o de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral; o Responsável por Incitar Militares a Aderirem ao Golpe de Estado; o Jurídico; o Operacional de Apoio às Ações Golpistas; o de Inteligência Paralela e o Núcleo Operacional para Cumprimento de Medidas Coercitivas.
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