Vida de luxo e intrigas: a ascensão do novo presidente do União Brasil

Por Andreza Matais e Eduardo Militão, do UOL Nos últimos dois anos, foram vendidas 42 McLarens zero km no Brasil. Uma delas foi comprada pelo novo presidente do União Brasil, Antônio Rueda, 49.

O advogado também adquiriu, em quatro anos, dois Porsches, duas Mercedes, uma Land Rover além de uma casa e dois terrenos em bairro nobre de Brasília. Esses bens somam cerca de R$ 23,5 milhões, segundo levantamento do UOL.

A maioria das aquisições aconteceu a partir de 2021, quando começou a ascensão de Rueda no União Brasil.

Foi também nessa época que ele estreitou laços com pessoas influentes como o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o desembargador Eduardo Martins, filho do ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Henrique Martins.

Rueda e Martins admitem que atuaram juntos em causas judiciais quando o filho do ministro ainda era advogado, mas dizem não se lembrar para quais clientes. Sobre as relações com o filho 01 do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), silêncio de ambos os lados.

O União Brasil receberá neste ano R$ 865 milhões em recursos públicos, o terceiro maior volume em fundos eleitoral e partidário, atrás apenas de PL e PT.

É Rueda quem decidirá o que fazer com o dinheiro e quanto cada candidato receberá para a campanha eleitoral deste ano.

Tal protagonismo ajuda a explicar o tamanho do poder que Rueda tem hoje em suas mãos — e isso sem jamais ter disputado uma eleição.

Antônio Rueda Imagem: Reprodução

‘Superunião’

Esse poder vai além de verbas para a eleição. O União Brasil tem os dois candidatos mais fortes para substituir Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG) nas presidências da Câmara e do Senado, respectivamente.

O deputado Elmar Nascimento (BA) e o senador Davi Alcolumbre (AP) podem comandar o Congresso no próximo biênio em um movimento político poucas vezes registrado na História brasileira.

Desde a redemocratização, em 1985, um mesmo partido comandou as duas Casas Legislativas simultaneamente apenas oito vezes, segundo levantamento do analista político Antonio Augusto de Queiroz para o UOL.

Coletiva de imprensa com o novo presidente do partido União Brasil, Antônio Rueda (ao centro) Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

O União também é o único partido que já tem candidato à sucessão de Lula (PT) em 2026: o governador de Goiás, Ronaldo Caiado.

A última pesquisa Genial/Quaest diz que ele tem aprovação de 86% dos eleitores no estado — é o mais bem avaliado entre os nomes de direita pesquisados.

No último mês, o UOL ouviu mais de uma dezena de pessoas e levantou informações em cartórios e órgãos oficiais para traçar o perfil do homem que controla esse arsenal.

Rompimento e traição
Rueda assumiu neste mês a presidência interina do União Brasil (fusão do PSL com o DEM) em uma disputa que virou caso de polícia.

Um dos fundadores do partido e afastado da presidência da sigla por decisão judicial, o deputado federal Luciano Bivar (PE) se diz traído por Rueda, a quem considerava como um filho. O “afilhado”, por sua vez, acusa o “padrinho” de malfeitos.

Rueda e Bivar começaram a se estranhar em 2019, quando Jair Bolsonaro (PL) deixou o PSL acusando Bivar de decidir sozinho sobre a distribuição de verbas e diretórios estaduais.

Antônio Rueda e Luciano Bivar, do União Brasil Imagem: Reprodução
Rueda ficou ao lado de Bolsonaro, de quem se aproximou há seis anos quando o ex-presidente entrou no PSL.

O distanciamento de Bivar e Rueda aumentou após a fusão com o DEM em 2021. Bivar novamente se recusou a compartilhar, desta vez com os novos parceiros, as decisões sobre recursos e diretórios.

O conflito levou Rueda a apoiar os caciques oriundos do DEM.

O rompimento ocorreu quando os novos aliados de Rueda propuseram a ele que disputasse a presidência da sigla contra Bivar. Ele aceitou, numa decisão que surpreendeu o grupo, dada a relação de pai e filho que Bivar e Rueda já tiveram.

A eleição para o comando do União seria em maio deste ano, mas, diante da resistência de Bivar em deixar o cargo, Rueda operou para afastá-lo antes disso. Para Bivar, foi uma traição.

Mesmo antes de assumir como presidente interino, Rueda já dava as cartas.

Ele colocou a irmã e o cunhado como tesoureiros e possuía uma procuração de Bivar para movimentar o dinheiro da sigla.

A família Rueda administrou quase R$ 1 bilhão (a soma dos fundos partidário e eleitoral) nas últimas eleições.

Foi uma casa de veraneio dessa irmã que pegou fogo em março, enquanto um imóvel de Rueda também era consumida pelas chamas. Ambas as propriedades ficavam em um condomínio de luxo na praia de Toquinho (PE).

O chefão do partido acusou Bivar de ser responsável pelo incêndio. O caso está sendo investigado pela polícia de Pernambuco.Desde que rompeu com Bivar, Rueda tem seguranças cercando sua casa em Brasília.

Quem para em frente ao seu escritório na cidade tem a placa anotada e recebe uma ligação da polícia para explicar as razões. Isso ocorreu com a reportagem do UOL.

Imagem: Arte/UOL Coleção de carros importados

Rueda era um jovem advogado sem patrimônio quando, há 20 anos, conheceu o empresário milionário e político Luciano Bivar.

Dono de uma empresa de seguros, Bivar declarou nas eleições de 2022 ter R$ 18,6 milhões, patrimônio inferior ao que seu pupilo acumulou nos últimos quatro anos, conforme levantamento do UOL, somente em bens.

Como nunca disputou eleições, o que se sabe do patrimônio de Rueda é o que está registrado em cartórios.

Os dois lados contam que Bivar “adotou” Rueda e montou para ele um escritório de advocacia voltado a atender contenciosos de massa (causas movidas em massa contra grandes empresas, geralmente trabalhistas ou de consumidores).

O UOL apurou que, até a briga, Bivar dava R$ 200 mil por mês ao escritório de Rueda para cuidar dos processos da sua seguradora.

A reportagem levantou que 4.000 ações do escritório Rueda & Rueda tramitaram no STJ nos últimos 16 anos. Os maiores escritórios na área costumam ter mais de 200 mil.

Pesquisa feita pelo Anuário Análise Advocacia ouviu 1.067 pessoas, entre elas executivos de empresas que atuam no DF e em 22 estados com faturamentos acima de R$ 500 mil ao ano, para saber quais as firmas mais admiradas entre os contratantes.

O Rueda & Rueda nem sequer é citado.

Rueda e a esposa, Florinda, posam em barco Imagem: Reprodução

Bivar levanta suspeitas sem provas de que o ex-pupilo enriqueceu quando passou a distribuir o dinheiro do partido.

Nos últimos três anos, o casal Antônio e Florinda Rueda comprou uma coleção de seis carros importados, estimada em ao menos R$ 8,7 milhões segundo a tabela Fipe, ou R$ 13,8 milhões, de acordo com classificados.

Não foram identificados registros de venda de imóveis ou veículos em seu nome nos últimos quatro anos no Distrito Federal.

A garagem milionária do advogado

Em primeiro plano, a McLaren do líder do União Brasil, Antonio Rueda Imagem: Reprodução
Eles ostentam na garagem uma Mclaren ano 2023, um Porsche 911 Targa edição comemorativa de 50 anos, um Porsche Taycan, duas Mercedes e uma Land Rover. Rueda terá de desembolsar neste ano R$ 63,9 mil de IPVA apenas com a McLaren.

A pedido do UOL, a consultoria automobilística Jato do Brasil levantou que, entre 2022 e março deste ano, apenas 42 McLarens foram comercializadas no país.

O casal Rueda também comprou nos últimos quatro anos R$ 9,8 milhões em imóveis em Brasília, segundo os valores registrados nas certidões.

São dois terrenos e uma casa na melhor área do Lago Sul, bairro nobre da capital federal e com a maior renda per capita do país (R$ 23 mil).

O presidente do União Brasil pagou R$ 4,5 milhões por um dos imóveis, registrado agora em 14 de março. O mesmo terreno, com 1.312 metros quadrados, foi comprado pelo antigo dono, dois anos antes, por R$ 5,7 milhões.

Pessoas que convivem com Rueda dizem que ele também tem um jatinho e um iate Azimut 80, cuja maquete ele exibe para quem o visita em São Paulo. O UOL não localizou esses bens em nome dele.

O patrimônio de Antônio de Rueda é fruto de sua atividade como advogado e está declarado às autoridades competentesassessoria de Rueda na única declaração à reportagem

Minuta do golpe selou rompimento

Em 2022, outro episódio ajuda a explicar o rompimento entre “pai e filho”.

Ligado ao União, Anderson Torres, então ministro da Justiça do governo Bolsonaro, teria pedido para se encontrar com Bivar pessoalmente.

Bivar pediu a Rueda para informá-lo do que se tratava, segundo apurou o UOL. Rueda e Torres se aproximaram desde que o ex-ministro foi secretário do governo Ibaneis Rocha (DF).

Segundo fontes ouvidas pela reportagem, Torres queria saber se o partido toparia apoiar a minuta de um golpe, que posteriormente seria apreendida na casa dele. O documento visava mudar o resultado das eleições que elegeram Lula à presidência.

Bivar respondeu que não envolveria a legenda nisso, rejeitou o encontro e encerrou o assunto.

O UOL apurou ainda que, para Bivar, esse episódio é o divisor de águas na relação com Rueda, que já era muito próximo de Flávio Bolsonaro, e decidiu terminar a relação de anos.

A assessoria do Anderson Torres confirma sua proximidade com Rueda, mas nega qualquer conversa sobre os atos golpistas.

O ex-ministro, que foi preso acusado de participar da articulação de um golpe de Estado e até hoje usa tornozeleira eletrônica, mantém a versão de que não compartilhou nem mostrou para ninguém o documento por considerá-lo um “lixo jurídico”.Colaborou Julia Affonso, do UOL, em Brasília

Reportagem

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