
Anos de recusa em dialogar com esferas superiores e decisões questionáveis na gestão local minam o protagonismo de Barreiras, enquanto cidades vizinhas avançam em setores estratégicos como a saúde e o agronegócio
Caso de Política | Luís Carlos Nunes – Barreiras, que por muito tempo ostentou o título de Capital do Oeste da Bahia, observa hoje um panorama de gradual perda de relevância regional. Essa erosão de protagonismo não é um acidente, mas o resultado de um ciclo de escolhas políticas e de gestão que, nas últimas administrações, deixaram a cidade para trás em momentos cruciais, permitindo que municípios vizinhos ocupassem posições de liderança em setores estratégicos.
O início dessa dinâmica pode ser traçado aos últimos – e longos – oito anos, sob a gestão do ex-prefeito Zito Barbosa (União Brasil). Uma postura de recusa em dialogar e estabelecer parcerias institucionais com os governos federal e estadual – frequentemente atribuída a divergências ideológicas – resultou em um fluxo reduzido de grandes investimentos e programas para o município. Durante esse período, decisões como a controversa venda da sede própria da prefeitura e a desativação do tradicional Parque de Vaquejada simbolizaram, para muitos, um desinvestimento no patrimônio e nas vocações da cidade.
Paralelamente, Luís Eduardo Magalhães, município vizinho, despontava com um vigor econômico notável, consolidando-se como o polo do agronegócio do Oeste Baiano. Os números demográficos atestam essa inversão: enquanto Barreiras cresceu aproximadamente 14,6% entre os censos de 2010 e 2022 (de 139.351 para 159.743 habitantes), Luís Eduardo Magalhães experimentou um crescimento explosivo de quase 80%, saltando de 60.105 para 107.970 habitantes, um claro indicativo da migração de investimentos e pessoas.
Saúde: A oportunidade perdida do Hospital Universitário e o risco de um “SUS Misto”
Na atual administração, sob o prefeito Otoniel Teixeira (União Brasil), Barreiras se vê diante de uma nova encruzilhada, desta vez na área da saúde. Há indicativos de que a cidade preteriria a instalação de um Hospital Universitário – uma estrutura que, se implantada, seria majoritariamente custeada por recursos federais – em favor de um modelo de Parceira Público-Privada (PPP) para a administração do futuro Hospital Municipal. Para especialistas, essa decisão pode comprometer o potencial de Barreiras em se consolidar como um polo regional de saúde de alta complexidade.
A diferença entre as opções é gritante. Um Hospital Universitário transcende o atendimento assistencial. Ele seria um centro de excelência, proporcionando:
- Atendimento de ponta: Capacidade para realizar procedimentos de alta complexidade e tratamentos especializados, com acesso a tecnologias de última geração.
- Formação de profissionais: Serviria como polo de estágio e residência para estudantes de medicina, enfermagem e outras áreas da saúde, atraindo e fixando talentos na região.
- Pesquisa e inovação: Impulsionaria a pesquisa clínica e científica, contribuindo para avanços na medicina e o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas.
- Impulso socioeconômico: Atrairia pacientes de diversas cidades e estados, dinamizando a economia local em setores como comércio e hotelaria, e elevando o status de saúde da região.
Em contraste, a escolha pela PPP para o Hospital Municipal levanta questionamentos sobre a onerosidade e os riscos para os cofres públicos e para a população. A minuta do contrato de concessão – cujo acesso público na página oficial da prefeitura foi suspenso, por motivos não esclarecidos – expõe cláusulas economicamente desfavoráveis ao município. Barreiras se comprometerá com uma “Contraprestação Pública” (o pagamento mensal direto à empresa concessionária) que se estenderá por 30 anos, representando um compromisso financeiro vultoso e de longo prazo para o orçamento municipal. Além disso, o município assume riscos de “reequilíbrio econômico-financeiro”, o que significa que poderá ter de arcar com custos adicionais em situações como mudanças nas políticas públicas de saúde, ou quando a demanda de atendimentos (como urgência/emergência ou ocupação de leitos acima de 90%) exceder as projeções iniciais.
Outro ponto de preocupação é a previsão de eventual incidência de IPTU sobre o próprio edifício hospitalar (propriedade do município), um imposto que, teoricamente, não incidiria sobre um bem público, mas que, se cobrado ou implicado no contrato, pode gerar uma despesa extra ou impactar a arrecadação da cidade.
Crucialmente, o contrato abre margem para um cenário de “SUS misto” ou “dual” dentro do futuro hospital. Embora a minuta assegure a “prestação gratuita e universal dos serviços de atenção à saúde no âmbito do SUS”, ela permite à concessionária explorar “Receitas Acessórias” (como detalhado nas Cláusulas 28.1 (ii) e 31.1). Isso significa que, dentro da mesma estrutura hospitalar que atende gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde, a empresa poderá oferecer e cobrar diretamente por determinados procedimentos ou serviços que não estejam definidos como parte do escopo gratuito do SUS.
Exemplos em contratos similares incluem consultas especializadas, exames diagnósticos de alta tecnologia ou cirurgias específicas, direcionadas a pacientes com planos de saúde ou particulares. Tal modelo levanta questionamentos sobre a equidade no acesso e o risco de priorização de atendimentos, criando, em tese, padrões de serviço diferenciados para quem pode pagar, mesmo em uma unidade construída com recursos públicos. Embora parte dessas “receitas acessórias” possa retornar ao município, não há garantia de que compensarão os altos custos da contraprestação pública.
Agronegócio: Riachão das Neves antecipa o Futuro da agroindustrialização do cacau
Enquanto a pauta da saúde em Barreiras se molda com escolhas que geram controvérsia, um movimento dinâmico e propositivo surge da vizinha Riachão das Neves, em um contraste marcante com a inação barreirense. Em um estratégico pronunciamento pelas redes sociais nesta quarta-feira (23), o prefeito Moabe Santana (Republicanos) lançou a audaciosa declaração: “Riachão das Neves é a capital do chocolate“.
A afirmação vai além do simbólico; ela posiciona o município como epicentro de uma futura agroindustrialização do cacau irrigado no Oeste da Bahia.
A ambição de Moabe Santana é sólida e baseia-se na enorme versatilidade do cacau para a geração de produtos de alto valor agregado. Para além do tradicional chocolate (em suas variadas formas, de barras a confeitos gourmets), o fruto possibilita a produção de:
- Nibs de cacau: Pedaços de amêndoa torrada e descascada, ideais como snack saudável ou ingrediente em confeitaria.
- Licor e manteiga de cacau: A pasta de cacau (licor) e a gordura natural da amêndoa (manteiga) são bases essenciais para a indústria alimentícia, cosmética (cremes, loções, batons) e farmacêutica.
- Pó de cacau: O subproduto da prensagem do licor, fundamental para achocolatados, bolos e sobremesas.
- Produtos da polpa: A polpa doce e ácida do cacau pode ser transformada em geleias, compotas, mel de cacau, e sucos.
- Bebidas inovadoras: Através de fermentação, a polpa pode originar vinagres e até destilados e bebidas alcoólicas com apelo gourmet, como o “cacau wine” ou “cacau gin”.
- Aproveitamento integral: Cascas e outros resíduos do fruto também podem ser transformados em ração animal e adubo orgânico, maximizando o aproveitamento e a sustentabilidade da cadeia.
A jogada política de Moabe ganha peso com a visita do governador Jerônimo Rodrigues agendada para este sábado (26). A oportunidade será crucial para o prefeito pleitear apoio direto do governo estadual para projetos de industrialização. O engajamento com Moisés Schmidt, presidente da influente Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (AIBA), em um plantio simbólico, reforça a seriedade da iniciativa. A AIBA projeta a expansão das lavouras de cacau irrigado de 1.500 para 20 mil hectares até 2030, prometendo um aumento de 50% na produção estadual. Riachão das Neves, já figurando como o sexto maior PIB agrícola da Bahia, está em plena corrida para capitalizar essa vasta oportunidade.
Diante desses movimentos dinâmicos e proativos em seu entorno, Barreiras, a pretensa “Capital do Oeste”, parece assistir com passividade. Sem um plano coeso e sem ações visíveis que consolidem sua identidade em múltiplos vetores de desenvolvimento – seja na apropriação de um polo de saúde universitário custeado pela União ou na liderança da industrialização de um produto agrícola com enorme potencial regional como o cacau -, a cidade corre o risco real de ver seu histórico protagonismo esvair-se por completo, enquanto oportunidades concretas de crescimento e liderança são abraçadas por seus vizinhos.
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