
A sessão legislativa se torna o epicentro de uma batalha que transcende o debate político, combinando táticas legais, midiáticas e institucionais em uma disputa por poder e narrativa
Caso de Política | Luís Carlos Nunes – A Câmara Municipal de Barreiras não apenas retomou seus trabalhos nesta terça-feira (05), mas mergulhou de cabeça em um cenário que pode ser descrito como uma Guerra Híbrida entre os poderes Executivo e Legislativo. Longe de uma sessão ordinária focada em projetos – o presidente da Casa, vereador Yure Ramon, estrategicamente optou por pautar apenas a leitura das contas de 2020 do ex-prefeito Zito Barbosa, que agora iniciam sua tramitação –, o plenário se transformou em um campo de batalha onde táticas convencionais e não convencionais se entrelaçaram em uma disputa acirrada por poder e narrativa. O estopim: o recente e viralizado incidente envolvendo o vereador João Felipe e a secretária municipal de Saúde, Larissa Barbosa.
A ofensiva em múltiplas frentes
O vereador João Felipe durante sessão na Câmara de Barreiras, em que transformou sua fala em ato de enfrentamento direto ao governo Otoniel Teixeira, denunciando o que classificou como ataque à democracia e precariedade nos serviços de saúde; ao final, lançou um desafio ao prefeito e prometeu resistência: “Vocês vão ter que me engolir
O vereador João Felipe abriu a sessão com uma ofensiva que combinou a denúncia pública, a reafirmação de sua legitimidade e o desafio direto ao Executivo. Em um discurso carregado de emoção, mas com a frieza de quem executa um plano, Felipe descreveu o confronto na maternidade como um ataque à democracia e ao povo. Sua “arma” principal foi a exposição das condições precárias da saúde – alimentação “horrível”, falta de itens básicos –, transformando a fiscalização em um ato de denúncia social.
A tática de João Felipe não se limitou ao verbal. Ele acusou a secretária Larissa Barbosa de conduta “criminosa” por impedir sua saída e incitá-lo, junto a “puxa-sacos que estão na folha de pagamento deste município”, em uma clara tentativa de provocação e desestabilização psicológica. O vereador ainda lançou um desafio direto ao prefeito Otoniel Teixeira, exigindo que “acorde, se posicione, saia do silêncio, saia do rabo de saia do seu vice-prefeito”, e que “não utilize o site oficial para apresentar uma nota mentirosa”, evidenciando a batalha pela verdade e pela imagem pública. Sua mensagem final, “Vocês vão ter que me engolir”, foi um grito de guerra.
Carmélia da Mata se soma a João Felipe, denuncia cerceamento e promete enfrentamento ao governo Otoniel
A vereadora Carmélia da Mata, aliada na trincheira do parlamentar, reforçou a ofensiva, solidarizando-se com João Felipe e utilizando sua própria experiência de “humilhação” como mulher na Casa para dar peso à denúncia. Ela defendeu a fiscalização como um “ato constitucional” e classificou a tentativa de impedimento como “desumano, desrespeitoso” e “crime”, posicionando-se ao lado de Felipe como “dois que não tememos e que não temos medo de ir para o enfrentamento”, ampliando a frente de combate.
A contraofensiva governista: defesa e contenção de danos
Durante o embate, vereadores da base partiram em defesa da secretária Larissa Barbosa. Adriano Stein afirmou não defender sua atuação, mas “a mulher Larissa”, criticando sua exposição nas redes e a omissão da Comissão da Mulher, em meio ao Agosto Lilás
Do outro lado do espectro, vereadores da base governista que se manifestaram, lançaram sua contraofensiva, empregando táticas de defesa da imagem e contenção de danos. Adriano Stein, por exemplo, optou por uma abordagem mais sutil, afirmando não defender a secretária em sua função, mas sim “sair em defesa da mulher Larissa Barbosa”. Ele questionou a exposição de sua vida e imagem nas redes sociais, e a inação da Comissão de Defesa das Mulheres da Casa, uma tática que busca desviar o foco da fiscalização para a suposta “violência” contra a secretária, em um movimento de “guerra de narrativas” que se alinha ao “Agosto Lilás“.
Dicíola Baqueiro enfrentou manifestações contrárias que logo foram contidas pelo presidente ao defender Larissa Barbosa, exaltando sua formação e a UPA de Barreiras, em tentativa de reforçar a imagem positiva da gestão
Dicíola Baqueiro, desafiando bravamente manifestações das galerias, manifestou “solidariedade à secretária Larissa Barbosa”, elogiando sua competência e formação, e citou elogios da secretária de Saúde do estado à UPA de Barreiras visando construir uma imagem positiva da gestão e da secretária, contrastando com as denúncias de precariedade.
o vereador Hipólito recorreu à nota do CREMEB para deslegitimar a visita de João Felipe à UPA, usando o discurso legalista como arma política e tática de intimidação institucional
Hipólito, por sua vez, utilizou o arcabouço legal como uma “arma” estratégica. Ele destacou o volume de procedimentos realizados e, crucialmente, invocou a nota do Conselho Regional de Medicina da Bahia (CREMEB), que, segundo ele, proíbe o acesso de parlamentares a unidades de saúde sem autorização e acompanhamento técnico. Essa manobra busca deslegitimar a ação de João Felipe, transformando a fiscalização em uma “invasão” e ameaçando com “sanções”, em uma clara tática de intimidação legal e institucional.
A nuance da oposição: A busca por diálogo de Delmah Pedra
Delmah prega respeito, humanidade e diálogo, defendendo ações concretas em vez de embates políticos ao mesmo tempo em que criticou exposição nas redes sociais
Em meio à polarização, a vereadora Delmah Pedra, buscou um caminho de conciliação e diálogo, afastando-se da linha mais combativa de outros colegas e mais dóceis dos que defendiam o governo. Ela iniciou sua fala sob o mote do “Agosto Lilás”, questionando a exposição de vidas em redes sociais. Em um tom que transcendia a imediata disputa, Delmah invocou princípios de respeito às autoridades, enfatizando que, apesar de possíveis divergências, tem “procurado diálogo, a conversa e mostrar muitas vezes situações que não estão condizentes com as necessidades do povo direcionando para que esse gestor possa ter um olhar mais humanizado”. Sua retrospectiva de seis meses de mandato, com foco em projetos sociais e visitas in loco a secretarias para apressar a solução de serviços, reforçou sua postura pragmática e voltada à resolução de problemas, destacando um compromisso com “ações concretas” e a “dignidade humana“, em vez de confrontos e embates diretos.
O presidente: O comandante na zona cinzenta
O presidente da Câmara, Yure Ramon, busca equilíbrio ao apelar pela harmonia entre poderes, reforçando a autonomia do Legislativo e o compromisso de proteger todos os vereadores
No centro dessa “Guerra Híbrida”, o presidente da Câmara, vereador Yure Ramon, assumiu o papel de um comandante que tenta evitar a escalada total, buscando “jogar água nisso tudo” e evitar a “instigação” de ambos os lados. Seu apelo à “harmonia” e à remoção do “ódio” e “rancor” é uma tentativa de desescalada, mas sem abrir mão da soberania de seu “território”.
Yure, contudo, não abdicou de sua posição de defensor da autonomia do Legislativo. Ele se colocou à disposição de “todos os 18 vereadores”, prometendo zelar pelo mandato de cada um e garantir que “nenhum vereador seja exposto de forma injusta”. Sua fala reforçou a independência da Casa:
“Os poderes são independentes, são harmônicos, tem que dialogar com o executivo? Tem! Mas sempre digo, a Câmara tem que ser independente.” Essa postura é um delicado equilíbrio entre a mediação e a reafirmação da força do Legislativo.
A batalha das narrativas e a “inteligência” externa
A complexidade do cenário é amplificada pela “batalha das narrativas” que se desenrola fora do plenário, uma característica central da guerra híbrida. Enquanto a Prefeitura emitiu nota de repúdio acusando João Felipe de “invasão inconsequente” e “exposição de mulheres internadas”, a Câmara, por sua vez, defendeu a prerrogativa constitucional de fiscalização e classificou a postura da Prefeitura como “tentativa de intimidação política”.
Rider Castro classifica o caso como “caso de polícia” e defende que a Câmara foque em pautas que beneficiem a população, evitando brigas políticas e exposições desnecessárias
Rider Castro, embora reconhecendo a tensão, apelou a ética e evitou “juízo de valor”, classificando o episódio como “um caso de polícia” a ser resolvido nos tribunais. Ele criticou o uso de celulares para fiscalização, que “acaba sim expondo pessoas, expondo servidores e expondo o cidadão”, e apelou para que a Casa se concentre em ações que “possam elevar a pauta da casa” e “transformar a vida da população”, em vez de “picuinhas” e “brigas”, em uma tentativa de desviar o foco da “guerra” para a “governança”.
Nesse contexto, a análise técnica do Portal Caso de Política, que realizou uma perícia “frame-by-frame” do vídeo da fiscalização, surge como um “relatório de inteligência” externo. O estudo contrapõe as alegações da Prefeitura sobre a “exposição indevida de pacientes”, não possibilitando identificações e apontando que a própria coordenadora da unidade estaria filmando o vereador. Essa “descoberta” é um golpe na narrativa do Executivo, fornecendo munição para a população e até mesmo sinalizando caminhos ao judiciário.
Uma outra questão que ficou clara após assistir por diversas vezes o vídeo éque em momento algum houve demérito ou depreciação de gênero contra a secretária, no momento mais quente do registro, quando secretária afirma ser “louca e meia” tanto a secretária como o vereador – com igualdade de armas levantaram o dedo em riste um ao outro, com direito a ampla “troca de de carteiradas”.
É crucial notar que, embora o CREMEB tenha se posicionado formalmente sobre o caso, sua competência é de órgão de classe, não de tribunal. A “Guerra Híbrida” de Barreiras, com suas acusações e contra-acusações, agora tem seu “campo de batalha” principal transferido para os tribunais, que serão os árbitros finais dessa disputa institucional.
A sessão desta terça-feira deixou claro que a “Guerra Híbrida” em Barreiras está longe de um armistício. A tensão permanecerá palpável por certo período, e a relação entre os poderes, marcada por desconfiança e acusações em múltiplas frentes, promete novos capítulos em um cenário político cada vez mais complexo e imprevisível.
O caso da fiscalização na maternidade, no entanto, é visto por muitos como apenas o estopim do que pode vir adiante. O Portal Caso de Política vem conversando desde o início desta legislatura e colhendo o “sentimento político” de diversos parlamentares, e há, ainda que inconscientemente, um desejo coletivo de realização legislativa.
Em um semestre tão produtivo como foi este primeiro de 2025, a tendência e o sentimento majoritário na Câmara são de concentrar esforços no cumprimento de leis recém aprovadas e já existentes, e na intensa cobrança ao Executivo pela realização das indicações aprovadas pelo parlamento. Isso deve pautar a política na cidade ou ao menos, pelos próximos meses.
Caso de Política | A informação passa por aqui.
#BarreirasEmGuerraHibrida #CriseInstitucionalBarreiras #FiscalizacaoNaSaude #TensaoPolitica #PoderesEmConflito #JoaoFelipe #LarissaBarbosa #YureRamon #BatalhaDeNarrativas #PoliticaBarreirense #BahiaPolitica