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Em entrevista, prefeito condiciona o futuro financeiro do município à aprovação de um novo empréstimo de até R$ 140 milhões e pressiona o Legislativo. Investigação revela que a Prefeitura se tornou refém dos bancos, gastando R$ 92 milhões com dívidas passadas e operando sob risco de paralisia de serviços e salários
Caso de Política | Luís Carlos Nunes – O prefeito Otoniel Teixeira (União Brasil) deflagrou, nesta sexta-feira (19), uma ofensiva política cuidadosamente calculada, embalada por um discurso emocional e apresentada como “parceria institucional”. Em entrevista ao radialista Marcelo Ferraz da rádio Oeste FM, o gestor utilizou o apelo sentimental como ferramenta retórica enquanto estabelecia, de forma simultânea, um cerco direto ao Poder Legislativo.
Após sancionar sem vetos os repasses mensais da Câmara e garantir a execução integral das emendas impositivas dos vereadores, Otoniel apresentou a conta política: cobrou a aprovação ainda em 2025 de um novo empréstimo de até R$ 140 milhões. O tom conciliador ocultou uma pressão explícita. Sem esse crédito, segundo a própria narrativa do prefeito, a chamada “Barreiras Bilionária” corre o risco de um apagão administrativo.
Máquina asfixiada: a prefeitura como gestora de dívidas
A urgência pelo novo crédito tenta encobrir uma realidade técnica exposta nas páginas da LOA 2026. A Prefeitura de Barreiras perdeu capacidade de executar obras e políticas públicas com recursos próprios, como IPTU e ISS. O orçamento já compromete R$ 92.065.571,00 apenas com juros e amortizações de dívidas passadas.
Somado a isso, o inchaço da folha de pagamento com grande número de servidores sem concurso público e com comissionados consome R$ 506.337.580,00, valor que drena grande parte da arrecadação antes mesmo da abertura dos serviços básicos. O diagnóstico investigativo é severo: com quase 60% do orçamento capturado por bancos e pessoal, a gestão opera tecnicamente engessada, dependente de novos empréstimos para manter a máquina funcionando.
Sem a autorização do crédito de R$ 140 milhões, áreas sensíveis como Saúde e Assistência Social podem enfrentar colapsos operacionais, e até o pagamento regular de salários passa a integrar o campo do risco fiscal. Barreiras passa a funcionar sob uma lógica de “cheque especial institucional”.
Governabilidade condicionada e a chantagem da conta
A estratégia política por trás do orçamento de R$ 1,09 bilhão é clara. Primeiro, assegura-se conforto financeiro ao Legislativo. Em seguida, cobra-se fidelidade na autorização de novos débitos.
“Sancionei na íntegra em respeito ao Legislativo… cada um toma sua decisão e arca com as consequências”, afirmou Otoniel.
Para quem acompanha as sessões legislativas e que tramita nos bastidores da política, a gritaria por parte de governistas é visível. Sem apoio firme no Legislativo, o líder do governo no parlamento afirmou, em tom indignado: “Otoniel não tem base nesta Casa”. Muito pelo contrário do que tenta passar o prefeito, o orçamento da Câmara e as emendas impositivas foram, na prática, um movimento rumo à autonomia e independência do Legislativo, e não um favor do Executivo ao sancioná-las. Ao longo deste ano de 2025, os parlamentares barreirenses vem demonstrando que decobriram o poder da união e como impor vitórias sob o executivo comandado por Otoniel Teixeira.
O recado é inequívoco. Os vereadores são colocados contra a parede: ou aprovam o novo endividamento, ou assumem a responsabilidade política por uma eventual paralisia administrativa. A governabilidade deixa de ser pacto institucional e passa a operar como instrumento de pressão orçamentária.
O “sentimento” de R$ 76 mil
O ápice da performance emocional ocorreu quando o prefeito evocou o legítimo choro de uma beneficiária do Residencial Solar dos Buritis. “O poder público tem que ter sentimento”, repetiu. No orçamento, porém, esse sentimento desaparece.
Para 2026, a verba destinada à Habitação Própria (Função 16) foi reduzida a R$ 76 mil, um corte superior a 80%, que, na prática, extingue a política habitacional municipal. Em um orçamento bilionário, o valor é simbólico e revela abandono deliberado da função.
Para sustentar a imagem de gestor sensível, Otoniel recorre às chamadas isenções fiscais em obras financiadas pela União e pelo Estado. Trata-se de uma caridade passiva, que não exige investimento direto do município. A contradição é evidente: Para 2026, a Prefeitura projeta arrecadar R$ 19,6 milhões em IPTU, mas investe 1.211 vezes mais em bancos do que em moradia popular, ou seja, os apenas R$ 76 mil.
Esse descompasso foi publicamente exposto pelo ministro Chefe da Casa Civil, Rui Costa, em matéria de 23 de março de 2025 do Portal Caso de Política, durante visita ao Residencial Solar Barreiras. Ao anunciar recursos do PAC para a construção de uma creche na localidade, Rui foi direto ao afirmar que orientou o prefeito a buscar o programa federal, ressaltando que o apoio vem do presidente Lula. A declaração funcionou como uma reprimenda pública à gestão municipal, ao deixar claro que os investimentos em moradia e equipamentos sociais não partem da Prefeitura, mas da União – enquanto o orçamento local praticamente zera a política habitacional.
Propaganda de luxo, social em dieta
Enquanto Habitação e políticas sociais são comprimidas, a Comunicação Social e o Cerimonial receberam um aumento de 716%, saltando para quase R$ 2 milhões. O investimento funciona como blindagem institucional para uma gestão que exibe prêmios e reconhecimento externo, enquanto reduz o alcance das políticas públicas básicas.
A Assistência Social sofreu um corte de R$ 1,8 milhão, comprometendo a rede de proteção aos mais vulneráveis. Em sentido oposto, a Cultura contará com R$ 34,4 milhões, sendo R$ 23,8 milhões destinados exclusivamente a festas. O orçamento deixa clara a prioridade: palcos, eventos e trios elétricos, enquanto bairros periféricos enfrentam escassez de serviços e amparo estatal.
Saúde como vitrine de inauguração
Ao afirmar que o Hospital Municipal é o maior desafio da gestão, Otoniel reforça o modelo “hospitalocêntrico”, justamente aquele que ignora o princípio básico segundo o qual prevenir é melhor do que remediar — o que, na prática, a Prefeitura não faz. A LOA 2026 destina R$ 127,8 milhões à assistência hospitalar, contra R$ 82,7 milhões para a Atenção Básica.
A prefeitura investe 54% a mais na cura do que na prevenção, privilegiando estruturas de alta visibilidade política e inaugurações, em detrimento do fortalecimento dos postos de saúde nos bairros. A lógica mantém o sistema dependente de grandes obras e novos empréstimos, enquanto o sofrimento cotidiano, evitável com políticas preventivas, permanece invisível.
A entrevista do prefeito foi cuidadosamente lírica; o orçamento, friamente excludente. Ao transferir ao Legislativo a responsabilidade pela autorização de um novo ciclo de endividamento de até R$ 140 milhões, sob risco de paralisia administrativa, Otoniel expõe o núcleo de sua estratégia.
O “bilhão” de Barreiras se revela menos como símbolo de prosperidade e mais como peça de marketing político, sustentada por propaganda institucional e juros bancários. Na periferia, o sentimento virou abandono: R$ 76 mil para moradia, cortes no social e uma cidade cada vez mais refém do sistema financeiro.
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