
Tradução de “reborn” é “renascido”, mas o fenômeno dos bonecos hiper-realistas revela uma geração emocionalmente falida que troca filhos reais por simulacros de silicone em um ritual que patologiza a dor e lucra com a alienação
Luís Carlos Nunes – “Reborn” significa “renascido”. Mas nada nasce de verdade nos braços de quem chama de filho um boneco de borracha. A obsessão contemporânea com os bebês reborn – réplicas hiper-realistas de recém-nascidos feitas de silicone ou vinil – ultrapassa o bizarro. É a institucionalização de um surto psíquico, celebrado, rentabilizado e defendido como terapia.
O fenômeno, que se espalha como uma febre silenciosa, é sintoma de um colapso coletivo: adultos emocionalmente desamparados investem tempo, dinheiro e afeto em bonecos inanimados que simulam a presença de um bebê. Dão mamadeira a olhos de vidro, trocam fraldas limpas de corpos de borracha, pagam por certidões falsas e agendam sessões fotográficas como se aquilo fosse amor. Mas não é.
É a estética da ternura encobrindo uma profunda falência emocional. O que parece cuidado é, na verdade, uma fuga brutal da realidade. O bebê reborn virou produto, identidade e consolo para uma geração que troca filhos reais – com demandas, riscos e reciprocidade – por uma fantasia estéreo, segura e sem dor.
A indústria aplaude e fatura. Psicólogos se omitem. Influenciadores promovem. A sociedade romantiza. Criam-se creches para bonecos, carteiras de vacinação imaginárias, encontros de “mães reborn” e consultórios terapêuticos que legitimam o delírio. O desespero real é tratado com afeto falso. A solidão é maquiada com plástico.
É mais do que fuga. É perversão do conceito de maternidade. Um útero simbólico que rejeita vida e abraça o simulacro. A humanidade que chora por bonecos é a mesma que abandona crianças de carne e osso, que banaliza abortos, que terceiriza o cuidado, que foge do sofrimento da criação.
O bebê reborn é o filho sem alma, o amor sem risco, o útero sem Deus. Uma maternidade sem sacrifício, sem reciprocidade, sem transformação. Um culto pós-moderno que sacrifica a realidade no altar do conforto emocional.
Enquanto isso, crianças reais seguem esquecidas. Violentadas, abandonadas, negligenciadas. Mas o mercado prospera embalando a psicose coletiva com paninhos bordados e berços de grife. Transformamos o luto, a frustração e o vazio em nichos de consumo. Romantizamos a loucura porque dá cliques, porque evita confronto, porque conforta o insuportável.
Estamos diante de uma geração que prefere brincar de amor do que amar de verdade. Que escolhe bonecos porque eles não exigem nada. O bebê reborn não é consolo. É sintoma. É a imagem mais crua de uma humanidade que desistiu de viver e passou a simular a vida.
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