
Foto: Dircom Barreiras – Otoniel apresentando proposta a investidores na Bolsa de Valores de São Paulo (B3)
Manobra orçamentária de R$ 4,4 milhões acende debate sobre modelo de gestão da saúde na capital do Oeste baiano, enquanto a população sofre com filas, falta de medicamentos e crise no atendimento
Caso de Política | Luís Carlos Nunes – Uma movimentação de R$ 4.432.600,00 no orçamento da Prefeitura de Barreiras, publicada no Diário Oficial de 15 de agosto de 2025, abriu uma caixa de pandora sobre o futuro da saúde no município. O decreto, que anula e suplementa verbas para viabilizar a construção de um novo hospital, tornou-se estopim de uma discussão que pode definir o legado da atual gestão e os rumos do atendimento por décadas: entregar a unidade à iniciativa privada por 30 anos ou transformá-la em um polo federal de ensino e pesquisa.
Em 8 de agosto de 2025, na Edição 4471 do Diário Oficial, a Prefeitura publicou o “Relatório da Consulta Pública da Concessão do Hospital de Barreiras”, documento elaborado pela consultoria FESPSP e datado de janeiro de 2025. Resultado da consulta pública realizada entre 22 de novembro e 22 de dezembro de 2024 (com audiência em 18 de dezembro), o relatório funciona como alerta técnico oficial, apontando riscos elevados, custos imprevisíveis e possíveis impactos duradouros ao erário caso a gestão do novo hospital seja delegada por 30 anos via PPP.
A canetada do prefeito Otoniel Teixeira, em tese um ajuste técnico-contábil, transferiu recursos da Secretaria Municipal de Saúde para o Fundo Municipal de Saúde (FMS), mantendo a destinação para “Construção e Estruturação do Hospital Municipal”. Administrativamente, a medida dá agilidade e centraliza a execução financeira da obra. Politicamente, abre espaço para uma escolha muito mais complexa e polêmica.
A controvérsia ganha impulso e força após a revelação de uma minuta de Parceria Público-Privada (PPP), que chegou a ser publicada no site da prefeitura e depois retirada. O documento previa um modelo de concessão de 30 anos, permitindo à empresa privada explorar o hospital, inclusive com possibilidade de cobrança em determinados serviços. Nessa configuração, o município bancaria a construção e, em seguida, pagaria mensalmente uma contraprestação milionária à concessionária. O compromisso engessaria o orçamento por ao menos sete gestões futuras, criando uma despesa fixa e de longo prazo para os cofres públicos.
Segundo o relatório oficial da FESPSP, a PPP proposta é de concessão administrativa, ou seja, 100% paga com recursos públicos municipais, abrangendo operação, manutenção e serviços assistenciais e não assistenciais. O estudo destaca a controvérsia da inclusão da chamada “bata-branca” (gestão de médicos, enfermeiros e atendimento clínico), recomendando sua remoção do escopo por elevar desproporcionalmente o risco operacional e, em última instância, onerar o contrato e a sociedade. O documento registra que a sugestão de exclusão foi “acatada no todo, ou em parte” no edital definitivo — formulação que deixa dúvidas sobre a retirada integral dos serviços assistenciais.
O relatório também questiona a fórmula de reajuste da contraprestação (IRCP = 55% IPCA + 25% CCT_enfermagem + 20% SINDAPOIO), alertando para desequilíbrios relevantes entre pagamento e custos, com risco de reequilíbrios frequentes e litígios. Cita experiências de PPPs de saúde no Brasil e em Portugal — como o Hospital do Subúrbio (BA) e o HEURO (RO) — marcadas por custos adicionais, superlotação, arbitragens milionárias e suspensão de contratos, exigindo gastos jurídicos de ambas as partes.
Na outra ponta, há proposta -0 que vem sendo ignorada pela atual gestão municipal – de transformar o novo hospital em Hospital Universitário (HU), vinculado à Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB). Nesse cenário, após a entrega da estrutura, a União assumiria a maior parte do custeio – folha de pagamento, insumos e manutenção – por meio dos Ministérios da Educação e da Saúde. Além de aliviar o orçamento municipal, a federalização abriria espaço para Barreiras se consolidar como centro regional de alta complexidade, ensino e pesquisa, enquanto a prefeitura poderia concentrar investimentos na atenção primária, hoje apontada pelos moradores como “caótica”.
Outra preocupação registrada em documentos correlatos é o risco de um “SUS Dual” por meio de “Receitas Acessórias” previstas em minutas, permitindo exploração comercial de atividades não essenciais — o que motivou manifestações, como a da Defensoria Pública, em defesa de um hospital 100% SUS, universal e gratuito.
A destinação dos R$ 4,4 milhões exclusivamente para obras também levanta críticas sobre prioridades. Em meio a reclamações de filas intermináveis para cirurgias, demora em consultas com especialistas e desabastecimento de farmácias, o mesmo valor poderia financiar mais de 650 cirurgias eletivas, custear milhares de consultas especializadas ou abastecer a rede básica por meses – medidas capazes de aliviar imediatamente a crise sentida pela população.
Para o novo Hospital que está em construção na cidade de Paulo Afonso – Hospital Universitário de Paulo Afonso (HUPA) -, o governo do Estado e parceria com o governo Federal vão investir aR$ 155,4 milhões, a nova unidade de saúde contará com 165 leitos, incluindo 30 de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), tornando-se referência no atendimento de média e alta complexidade na região. Além de ampliar a assistência hospitalar, o HUPA terá um papel fundamental na formação de novos profissionais da área, fortalecendo o ensino e a pesquisa na região do sertão baiano
A administração municipal de Barreiras está, portanto, diante de uma encruzilhada estratégica. De um lado, o caminho da PPP, que pode gerar dependência financeira e comprometer a autonomia do município por décadas. De outro, a articulação para um Hospital Universitário, opção mais complexa, mas que poderia transformar Barreiras em referência regional, com sustentação da União.
A decisão em curso definirá se o novo hospital será um centro de custo bilionário para o contribuinte barreirense ou um investimento estratégico federal que fortaleça toda a região Oeste da Bahia.
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