
Proposta exige presença no Brasil, reação imediata contra crimes e criação de agência reguladora; país busca se alinhar à União Europeia na vanguarda digital, mas deve enfrentar resistência política e empresarial
Caso de Política | Luís Carlos Nunes – Em um movimento estratégico para impor soberania no ambiente digital e modernizar a legislação, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva apresentou, na última sexta-feira (22), as diretrizes de dois projetos de lei que estabelecem um marco regulatório para as big techs. A iniciativa cria um ecossistema de responsabilidades claras, com foco em transparência, combate a ilícitos e proteção dos usuários, encerrando a era da autorregulação das plataformas.
A proposta aproxima o Brasil dos padrões mais avançados do mundo, tendo como principal referência o Ato de Serviços Digitais (DSA), da União Europeia, que se tornou referência global desde 2022.
Ação imediata contra crimes cibernéticos
Um dos pontos centrais do projeto é a obrigação de que as plataformas removam imediatamente conteúdos enquadrados em 11 tipos criminais graves, sem necessidade de ordem judicial. Entre eles estão:
- Crimes contra crianças e adolescentes.
- Atos de terrorismo ou preparativos.
- Indução ao suicídio e automutilação.
- Lesão corporal.
- Tráfico de pessoas.
- Crimes contra a dignidade sexual.
- Causar epidemia.
- Falsificação de produtos terapêuticos ou medicinais.
- Crimes contra a democracia e o Estado de Direito.
- Crimes praticados contra a mulher em razão de gênero.
- Discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
Brasil na vanguarda digital
A medida se inspira diretamente na lógica europeia de notice-and-takedown, segundo a qual, uma vez notificada de conteúdo ilegal, a plataforma deve agir de imediato, sob pena de responsabilização. Os resultados do modelo europeu são expressivos: apenas no primeiro semestre de 2025, mais de 41,4 milhões de conteúdos foram removidos na União Europeia após notificações.
No Brasil, a ausência de legislação específica vinha deixando o tema nas mãos do Judiciário, que decidia caso a caso. O projeto do governo Lula busca corrigir essa lacuna ao trazer segurança jurídica e instituir regras claras por meio do processo legislativo – considerado o caminho democrático adequado para debates dessa envergadura.
Novas obrigações e sanções severas
As big techs terão de atender a uma série de exigências para operar no país:
- Presença física: manutenção de escritório e Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) no Brasil.
- Transparência e auditoria: divulgação periódica de relatórios e submissão a auditorias externas independentes.
- Gestão de riscos e cooperação: protocolos para emergências públicas, avaliação de riscos sistêmicos e abertura à fiscalização presencial pela autoridade reguladora.
Para garantir a efetividade das medidas, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) será transformada em uma nova Autoridade de Regulação das Redes, com poderes ampliados para fiscalizar e aplicar punições. As sanções vão de advertências e multas que podem chegar a 10% do faturamento da empresa até a suspensão de suas atividades em casos graves.
Disputa política e resistência empresarial
Apesar da robustez do projeto, o governo deve enfrentar um campo de batalha político e empresarial. As big techs já sinalizam incômodo com as exigências, alegando risco de excesso regulatório, custos adicionais e possíveis impactos na liberdade de expressão. Grupos de lobby prometem intensificar a pressão sobre parlamentares, em especial da oposição, para frear ou suavizar os pontos mais rígidos da proposta.
No Congresso, a discussão tende a ser polarizada. Enquanto parte da base governista enxerga na regulação um passo histórico para proteger a democracia e reduzir abusos das plataformas, opositores podem explorar o discurso de censura ou intervenção estatal excessiva. O cenário antecipa embates que devem prolongar a tramitação e testar a articulação política do Palácio do Planalto.
Efeitos econômicos e sociais positivos
Além da dimensão política, o projeto pode trazer efeitos concretos para a economia brasileira. A exigência de presença física no país deve estimular a abertura de escritórios, gerando empregos diretos e indiretos em áreas como atendimento, tecnologia e compliance. A transparência obrigatória e a fiscalização mais rígida tendem a nivelar o mercado, favorecendo startups e empresas nacionais que disputam espaço com gigantes globais.
Do ponto de vista social, especialistas apontam que a regulação pode reduzir a disseminação de desinformação, discursos de ódio e práticas ilícitas que corroem a confiança nas instituições democráticas. Isso não apenas protege a cidadania digital, mas também fortalece o ambiente de negócios, ao criar um ecossistema mais estável e previsível para investimentos no setor de tecnologia.
Compromisso com a democracia
Ao detalhar um projeto abrangente e alinhado a experiências internacionais de sucesso, o governo Lula sinaliza que o espaço digital brasileiro deixará de ser um “território sem lei”. A regulação busca proteger os cidadãos, assegurar transparência e reforçar a estabilidade das instituições democráticas frente ao poder crescente das plataformas digitais. A batalha, no entanto, não será apenas jurídica e regulatória: será também política, com intensos embates entre Executivo, Legislativo e grandes corporações globais.
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