
Fotos: Luís Carlos Nunes, Caso de Política
Inspeção liderada pelo promotor Eduardo Bittencourt revela abismo entre o projeto pago e a realidade: pista de skate de 1.500m², ciclovias de 2km e segurança monitorada ficaram no papel, mesmo com gasto milionário da gestão Zito Barbosa
Caso de Política | Luís Carlos Nunes – O Ministério Público da Bahia (MPBA) realizou, ao longo desta quinta-feira (04), uma inspeção técnica rigorosa nas Glebas A e B do Parque Municipal de Barreiras. O que deveria ser a consolidação de um grande equipamento de lazer tornou-se a constatação de um descumprimento sistemático do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC), firmado em julho de 2020. O promotor de justiça regional ambiental, Eduardo Bittencourt, foi incisivo: o parque foi “aberto ao público”, mas não entregue conforme o pactuado, resultando na deterioração de um investimento milionário.
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A visita expôs o abismo entre o projeto original – que visava substituir uma multa de cerca de R$ 8,4 milhões – e a realidade encontrada em dezembro de 2025. O cenário é de obras que não obedecem às medidas contratadas e equipamentos essenciais que jamais saíram do papel.
A conta não fecha: R$ 14,5 milhões empenhados para uma obra incompleta
Um dos pontos mais alarmantes levantados na inspeção é a disparidade entre o volume de dinheiro público injetado e a precariedade do espaço. Durante a visita, o promotor alertou que “o patrimônio público está indo embora” e que “o investimento multimilionário está se perdendo”.

A estimativa do MP é conservadora perto dos dados oficiais. De acordo com informações oficiais da Prefeitura Municipal de Barreiras, assinadas pelo ex-prefeito e compromissário do TAC, Zito Barbosa, em 2022 o valor contratado e empenhado para a obra foi de R$ 14.584.490,62.
O montante gasto supera em quase o dobro a multa original que o TAC visava compensar. No entanto, o retorno para a população é um parque inacabado e sem manutenção.
Muito além da acessibilidade: o abismo técnico e as “obras fantasmas”

Promotor Eduardo Bittencourt (camisa verde), acompanhado por vereadores e membros da prefeitura, em vistoria ao Parque Natural de Barreiras na manhã desta quinta-feira (04)
Embora o promotor Eduardo Bittencourt tenha destacado em sua fala a falta de sensibilidade quanto à acessibilidade – classificando 90% da área como não acessível -, a inspeção técnica revelou que o descumprimento vai muito além. Ao confrontar o texto do acordo com a estrutura física, percebe-se que diretrizes de engenharia e arquitetura foram ignoradas.
O TAC era específico em medidas e dimensões, transformadas agora em letra morta:
- Pista de Skate: O acordo exigia uma área construída não inferior a 1.500m², contendo estruturas complexas como bowls, half pipes e pools. A realidade local passa longe dessa especificação técnica.
- Pistas de Caminhada e Ciclovias: Deveriam ter largura mínima de 3,0 metros cada e uma extensão não inferior a 2 km, garantindo segurança e fluxo. O que se vê são trechos que não atendem a essas medidas de conforto e segurança.
- Esportes Radicais: O projeto previa uma pista de BMX de 450 metros e uma pista de “pump track” asfaltada com extensão mínima de 500 metros e largura de 2 metros. Tais equipamentos, fundamentais para a juventude, não foram entregues conforme a exigência técnica.
- Segurança e Infraestrutura: O compromisso incluía o cercamento total da área e a instalação de um sistema de videomonitoramento com, no mínimo, 08 câmeras estratégicas, além de iluminação adequada para uso noturno em todas as áreas de lazer. A ausência desses itens torna o parque inseguro após o pôr do sol.
- Gestão de Resíduos: Até as lixeiras foram negligenciadas. O TAC estipulava a instalação de, no mínimo, 50 conjuntos de coleta seletiva, algo não verificado na proporção exigida.
“Nós estamos em dezembro de 2025 com o Parque Municipal que ainda não entregou toda a estrutura que foi pactuada”, reforçou Bittencourt. “A gente já sabe que não está funcionando”.
A falência da gestão municipal direta
Diante do cenário de abandono na Gleba A e da complexidade de manejo da Gleba B (área de preservação de 44 hectares, onde 40% deveria ser intocável), Bittencourt avaliou que a Prefeitura não possui know-how para administrar o complexo sozinha.
“O município não vai avançar nessa prática se depender de gestão pública desse espaço. Isso não vai acontecer”, afirmou categoricamente. O promotor sugere a necessidade urgente de parcerias ou terceirização profissional, visto que a administração local não tem “o hábito de fazer” esse tipo de gestão.
Responsabilidade compartilhada e cobrança futura
Embora o tom da reunião desta quinta-feira tenha sido de busca por soluções técnicas (“propositiva”, nas palavras de Eduardo Bittencourt), o Ministério Público da Bahia deixou evidente que o “dia do acerto de contas” é inevitável. Diante da comprovação de que R$ 14.584.490,62 foram empenhados em uma obra entregue pela metade e já em deterioração, o promotor garantiu que as sanções pelo descumprimento do TAC e pelo possível dano ao erário não serão esquecidas.
“Existirá um momento de cobrança de responsabilidades? Sim. Não é esse. Mas no momento em que se cobrar responsabilidades, da mesma forma que toda a administração pública, será publicizada a cobrança dessas responsabilidades coletivas ou individuais”, assegurou Bittencourt.
Ele revelou ainda que o caso já escalou para além da esfera ambiental: a Promotoria de Moralidade Administrativa e Patrimônio Público também está envolvida na apuração, visando investigar a gestão dos recursos.
O promotor foi duro ao cobrar que o Ministério Público não atue sozinho como “fiscal do povo”. Ele convocou os “co-legitimados” – termo jurídico para órgãos que também têm o dever de agir – a saírem da passividade. A convocação recaiu pesadamente sobre a Câmara Municipal de Vereadores, o Conselho Gestor do Parque, órgãos ambientais estaduais e a sociedade civil organizada (incluindo universidades).
“Não adianta apenas o Ministério Público enxergar isso aqui… A Câmara tem responsabilidade, o Conselho tem responsabilidade… Em vez de cada um ficar dizendo ‘ah, você fez ou deixou de fazer’, estamos aqui para verificar o que podemos fazer em conjunto”, pontuou.
O alerta final foi dramático: ou se adota um modelo de gestão eficiente e compartilhado imediatamente, ou o Parque Municipal se consolidará como um elefante branco definitivo, enterrando de vez os milhões investidos.
“A única opção que não temos é não avançar. Porque o patrimônio público está indo embora”, concluiu o promotor.
Histórico do Acordo
A origem das obrigações que hoje se encontram descumpridas remonta a uma longa batalha judicial iniciada com o Inquérito Civil nº 593.2.55155/2005 e que culminou na Ação de Execução Judicial nº 0506213-88.2017.08.05.0022. O documento decisivo foi firmado em 09 de julho de 2020, momento em que se formalizou a estratégia de converter uma dívida milionária do município – oriunda da gestão irregular de resíduos sólidos – na obrigação de entregar um parque ambiental e de lazer à população.
A elaboração e a assinatura deste pacto contaram com a chancela de uma força-tarefa do Ministério Público do Estado da Bahia, representada pelos promotores de justiça Eduardo Antonio Bittencourt Filho (Promotoria Regional Ambiental), André Luís da Silva Fetal (1ª Promotoria de Justiça de Barreiras) e Artur José dos Santos Rios (8ª Promotoria de Justiça).
Pelo Poder Executivo Municipal, a responsabilidade central pelo acordo recaiu sobre o então gestor, Zito Barbosa. É importante ressaltar que, no documento, o ex-prefeito assinou não apenas como representante legal do Município de Barreiras (1º Compromissário), mas também na figura de pessoa física e avalista solidário (“2º Compromissário”). Ao apor sua assinatura, Zito Barbosa assumiu o compromisso direto de que a multa de mais de R$ 8 milhões seria convertida em benefícios reais para a comunidade, validando prazos e especificações técnicas que, conforme a recente inspeção e fala do promotor de justiça, foram ignorados.
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